sexta-feira, 20 de maio de 2011

BULLYING

De acordo com a Constituição Federal Art. 5° todos tem direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança, sendo invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas. Isso significa que todos têm o direito de agir da forma como achar necessário, desde que dentro da lei e, sem sofrer nem praticar qualquer tipo de descriminação ou violência.

Segundo Eduardo R. Rabenhorst, Doutor em Filosofia pela Universite de Strasbourg, Diretor do Centro de Ciências Jurídicas e Professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas, os direitos dependem da existência de leis, juízes, advogados etc. Porém, muito dificilmente eles serão observados se não tivermos consciência e capacidade de organização para lutar por eles.

Em se tratando de direitos humanos, Rabenhorst, nos diz que Direitos Humanos são direitos que possuímos pelo simples fato de que somos humanos. Marconi Pequeno, Pós-doutor em Filosofia pela Universidade de Montreal (Canadá), Docente do Programa de Pós-Graduação em Filosofia e membro do Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba acredita que se trata da conquista de uma vida digna, daí serem considerados fundamentais à nossa existência. Para ele trata-se daqueles direitos considerados fundamentais, que tornam os homens iguais, independentemente do sexo, nacionalidade, etnia, classe social, profissão, opção política, crença religiosa ou convicção moral.

Todos esses valores mencionados são formados primeiramente na família, mas, no entanto, é na escola que o ser humano pode botar em prática pela primeira vez tudo que aprendeu em sua casa. É nesse ambiente rodeado por diversos tipos de sujeitos que ele saberá como se portar com os colegas e professores. Contudo, não é sempre assim que acontece. Por motivos sociais e culturais, o cidadão-aluno vai para a escola sem a bagagem necessária para uma boa convivência em grupo. Logo, é tarefa também da mesma, atender a essa necessidade de forma que esse indivíduo possa viver em sociedade, respeitando os direitos de sua comunidade.

Conforme Pequeno, o processo educacional pode fornecer ao homem os instrumentos necessários para que ele possa constituir as bases de um viver compartilhado e baseado nos valores de solidariedade, justiça, respeito mútuo, liberdade e responsabilidade. A educação em direitos humanos é uma forma de o sujeito reconhecer a importância da dignidade, diz ele.

O Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos diz que educar em direitos humanos é contribuir para a construção da cidadania, o respeito à pluralidade e à diversidade sexual, étnica, racial, cultural, de gênero e de crenças religiosas.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação estabelece que educar em direitos humanos é fomentar uma prática educativa “inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, com a finalidade do pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. (Comitê Nacional de Educação em Direitos Humanos Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, 2003, pág.11)

Lamentavelmente, o que se observa nas escolas hoje, principalmente entre os adolescentes, são estudantes descompromissados com a educação, com comportamentos rudes e vergonhosos e, em contrapartida, professores desestimulados e preocupados com o futuro dos mesmos. Um exemplo disso é o famoso “Bullying”. Bullying[1] é um termo da língua inglesa (bully = “valentão”) que se refere a todas as formas de atitudes agressivas, verbais ou físicas, intencionais e repetitivas, que ocorrem sem motivação evidente e são exercidas por um ou mais indivíduos, causando dor e angústia, com o objetivo de intimidar ou agredir outra pessoa sem ter a possibilidade ou capacidade de se defender, sendo realizadas dentro de uma relação desigual de forças ou poder.

De acordo com Portal Educacional [2], o Bullying começou a ser pesquisado cerca de dez anos atrás na Europa, quando se descobriu o que estava por trás de muitas tentativas de suicídio entre adolescentes. Essas agressões verbais, físicas e morais foram vistas como uma forma de violência e passaram a se chamar de Bullying.

Na matéria para a Revista escola, Orson Camargo [3], Colaborador Brasil Escola, diz que o bullying é um problema mundial, podendo ocorrer em praticamente qualquer contexto no qual as pessoas interajam, tais como escola, faculdade/universidade, família, local de trabalho e entre vizinhos. Segundo ele, as pessoas que testemunham o bullying, na grande maioria, alunos, convivem com a violência e se silenciam em razão de temerem se tornar as “próximas vítimas” do agressor.

As crianças ou adolescentes que sofrem bullying podem se tornar adultos com sentimentos negativos e baixa autoestima. Tendem a adquirir sérios problemas de relacionamento, podendo, inclusive, contrair comportamento agressivo. Em casos extremos, a vítima poderá tentar ou cometer suicídio. (Camargo, s/d).

Camargo relata que os autores das agressões geralmente são pessoas que têm pouca empatia, pertencentes às famílias desestruturadas, em que o relacionamento afetivo entre seus membros tende a ser escasso ou precário. Os valores que formam os seres humanos começam primeiramente na família e esses sujeitos vêm de uma formação sem a fundamentação do que é respeito, dignidade e diversidade. Acabam descontando suas amarguras e revoltas naqueles que não conseguem ignorá-los por serem inseguros ou receosos. Camargo ressalva que:

O alvo dos agressores geralmente são pessoas pouco sociáveis, com baixa capacidade de reação ou de fazer cessar os atos prejudiciais contra si e possuem forte sentimento de insegurança, o que os impede de solicitar ajuda(... ) Os atos de bullying ferem princípios constitucionais – respeito à dignidade da pessoa humana – (Camargo, s/d)

Dessa forma, o Bullying viola os direitos humanos de qualquer pessoa, seja ela criança, adolescente, jovem ou mesmo adulta. Além disso, essa forma de agressão se espalhou também na internet e no celular. A Revita Nova Escola de junho/julho 2010[4] publicou uma reportagem, a pedido dos leitores, sobre o assunto. Na reportagem, Beatriz Santomauro, chama de Cyberbullying as agressões com o uso da tecnologia, que se baseiam em e-mails ameaçadores, mensagens negativas em sites de relacionamento e torpedos com fotos e textos constrangedores para a vítima. Santomauro diz que a tecnologia permite que, em alguns casos, seja muito difícil identificar o agressor, o que aumenta a sensação de impotência.

Em entrevista uma menina de 13 anos conta que:

Colegas de classe criaram uma comunidade no Orkut (rede social criada para compartilhar gostos e experiências com outras pessoas) em que compararam fotos suas com as de mulheres feias. Tudo por causa de seu corte de cabelo. ‘Eu me senti horrorosa e rezei para que meu cabelo crescesse depressa’ (Santomauro, s/d).

Esse é uma amostra dos “contras” da tecnologia. Essa comunidade criada pelos colegas dessa menina pode ser vista por inúmeras pessoas, ridicularizando e constrangendo a adolescente. Aramis Lopes[5], médico pediatra e especialista em bullying e cyberbullying diz que em ambas as agressões existem o autor, o alvo e o alvo/autor. E também existem as testemunhas. Embora não sofram nem pratiquem bullying, elas convivem num ambiente onde isso existe.

Vimos que 40% dos alunos têm envolvimento direto com o bullying, como autores ou alvos. Cerca de 60% são testemunhas, que também sofrem. Perguntamos aos alunos o que eles sentem quando veem um colega fazendo bullying, e 80% dizem reprovar. Então, é uma maioria que não aceita esse comportamento, mas também não reage. Como isso não é discutido, o aluno fica com medo de ser a próxima vítima, e também existe a história de ser um dedo-duro, de acusar um colega, que está expondo-o a um castigo. Isso impede o aluno de reagir e ele fica num ambiente inseguro, porque a escola também não toma nenhuma atitude. Muitas das testemunhas acabam se tornando autores de bullying, porque geralmente os autores adquirem poder sobre o grupo e popularidade entre os colegas. É o "bonzão" da turma: é o que brinca com todo mundo, que faz piadinha, sempre acompanhado de dois ou três que o seguem. (Lopes, s/d).

Em certos casos, o bullying pode se tornar bem mais que uma piadinha, levando suas vítimas à morte. O jornalista Diogo Dreyer, relata ao Portal Educacional[6]que:

Em janeiro de 2003, Edimar Aparecido Freitas, de 18 anos, invadiu a escola onde havia estudado, no município de Taiúva, em São Paulo, com um revólver na mão. Ele feriu gravemente cinco alunos e, em seguida, matou-se. Obeso na infância e adolescência, ele era motivo de piada entre os colegas(...)

(...) Na Bahia, em fevereiro de 2004, um adolescente de 17 anos, armado com um revólver, matou um colega e a secretária da escola de informática onde estudou. O adolescente foi preso. O delegado que investigou o caso disse que o menino sofria algumas brincadeiras que ocasionavam certo rebaixamento de sua personalidade. (Dreyer, s/d).

O jornalista alerta que os episódios que terminam em homicídio ou suicídio são raros e que não são poucas as vítimas do bullying que, por medo ou vergonha, sofrem em silêncio.

A CARTILHA LEGAL

Em julho DE 2010 o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro lançou a “Cartilha Legal” e, segundo a Assessoria de Imprensa TJRJ[7], o material busca informar a população sobre seus direitos, para que seja exercida a cidadania. A cartilha foi ilustrada com personagens do Sítio do Pica-Pau Amarelo, de Monteiro Lobato, e trata de temas como a Infância e Juventude, o Idoso, a Vizinhança, o Direito do Consumidor e o Direito Penal, entre outros. Traz, ainda, uma lista de telefones úteis no final. Ela será distribuída gratuitamente pelo TJRJ para a população com pouco acesso à informação e à Justiça.

A cartilha explica os conceitos de bullying, seus tipos, significados e oferece dicas de como lidar com a agressão. A médica psiquiatra e autora da cartilha, Ana Beatriz Barbosa Silva, explica que as principais razões que levam os jovens a serem agressores são a falta de limites em seus processos educa­cionais no contexto familiar, vivenciam dificuldades momentâneas, como a separação traumática dos pais, ausência de recursos financeiros, doenças na família e, em contrapartida, aponta os principais problemas das vítimas de bulling que, segundo ela, são desinteresse pela escola; problemas psicossomáticos; problemas comportamentais e psíquicos como transtorno do pânico, depressão, anorexia e bulimia, fobia escolar, fobia social, ansiedade generalizada, entre outros. A psiquiatra alerta para os problemas mais sérios devido ao tempo prolongado de estresse a que a vítima é submetida como quadros de esquizofrenia, homicídio e suicídio.

A Cartilha nos mostra como diagnosticar o agressor e o agredido e alerta que:

Na Escola: as vítimas se encontram isoladas do grupo, ou perto de alguns adultos que possam protegê-las; na sala de aula apresentam postura retraída, faltas frequentes às aulas, mos­tram-se comumente tristes, deprimidas ou aflitas; nos jogos ou atividades em grupo sempre são as últimas a serem escolhidas ou são excluídas; aos poucos vão se desinteressando das atividades e tarefas escolares; e em casos mais dramáticos apresentam hematomas, arranhões, cortes, roupas danificadas ou rasgadas.

Em Casa: Frequentemente se queixam de dores de cabeça, enjoo, dor de estômago, tonturas, vômi­tos, perda de apetite, insônia. Todos esses sintomas tendem a ser mais intensos no período que antecede o horário de as vítimas entrarem na escola. Mudanças frequentes e intensas de estado de humor, com explosões repentinas de irritação ou raiva. Geralmente elas não têm amigos ou, quando têm são bem poucos; existe uma escassez de telefonemas, e-mails, torpedos, convites para festas, passeios ou viagens com o grupo escolar. Passam a gastar mais dinheiro do que o habitual na cantina ou com a compra de objetos diversos com o intuito de presentear os outros. Apresentam diversas desculpas (inclusive doenças físicas) para faltar às aulas. (SILVA , 2010, PAG.10-11).

Silva ressalva que o comportamento dos agredidos difere de acordo com o ambiente que freqüentam e que os pais e os profissionais da escola devem ficar atentos aos sinais de bullying. A escola tem um papel de suma importância nesse combate contra a violência. Também consta na cartilha que é na escola que a maioria dos casos se agrava e é responsabilidade da direção da mesma avisar os pais, conselhos e órgãos de proteção à criança e ao adolescente.

Juntamente com a escola os pais também devem ficar atentos pois na maioria das vezes, as crianças normalmente não relatam o sofrimento vivenciado na escola, por medo de represálias e por vergonha. A observação dos pais sobre o comportamento dos filhos é fundamental, bem como o diálogo franco entre eles. Os pais não devem hesitar em buscar ajuda de profissionais da área de saúde mental, para que seus filhos possam supe­rar traumas e transtornos psíquicos. (SILVA , 2010, PAG.14).

Partindo dessa premissa, a escola segundo Pietro e Véras Neto (s/d, por ser um dos principais ambientes responsáveis pela transmissão da cultura e transformação das estruturas sociais, necessita de propostas pedagógicas ajustadas às necessidades das crianças, famílias e comunidades.

Muitos governantes preocupam-se com a apresentação física, com os recursos materiais, com a quantidade de equipamentos e com a atualização da tecnologia educacional das escolas. A qualidade das relações entre o próprio corpo docente e dos docentes com seus alunos permanece em segundo plano... não importam as condições físicas ou a modernidade dos prédios escolares nem mesmo a baixa relação entre o número de alunos e professores. O que realmente ficou evidente foi a importância da escola enquanto organização, suas normas e valores sociais. (PIETRO e VÉRAS NETO s/d, pág. 4 e 5).

Assim, conclui-se que a escola juntamente com a família tem o compromisso de auxiliar e cuidar desses sujeitos que sofrem ou praticam o bulling para que eles tenham a conscientização de que direitos humanos são essenciais para uma vida digna e para a construção de uma sociedade mais justa, livre de preconceitos raciais, sexuais, religiosos ou de classe, da violência física ou verbal. Alertar que esses direitos devem ser respeitados independente do lugar onde estejam inseridos.


[1] Disponível em: http://www.brasilescola.com/sociologia/bullying.htm acesso em 23/10/10.

[3] Graduado em Sociologia e Política pela Escola de Sociologia e Política de São Paulo – FESPSP Mestre em Sociologia pela Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP

[4] Revista Escola Ano xxv, N°223 junho/julho 2010

[6] Trata-se de um ambiente de conhecimento, ensino e aprendizagem com milhares de informações organizadas e avaliadas sobre Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, além de recursos de administração escolar, comunicação entre usuários, assessorias, artigos, atualidades, entre outros, ao qual sua escola pode associar-se, tornando-se parceira no projeto.